Como Lula reverteu a Magnitsky de Alexandre de Moraes

A reversão das sanções impostas a Alexandre de Moraes com base na Lei Magnitsky não foi um gesto improvisado nem fruto de acaso. Foi o desfecho de um método. Enquanto o bolsonarismo tentou transformar a política externa em extensão de guerra cultural, Lula operou no terreno em que a diplomacia de Estado sempre funcionou: diálogo direto, pragmatismo e negociação de interesses.
O episódio expõe, com nitidez, um erro estrutural do bolsonarismo. Ao longo dos últimos anos, o grupo tratou a diplomacia brasileira como instrumento ideológico, frequentemente capturado por agendas pessoais e cruzadas simbólicas. O caso mais emblemático foi a gestão de Ernesto Araújo no Itamaraty, descrita por diplomatas e analistas como um período sem precedentes de isolamento, conflito gratuito e abandono das tradições da política externa brasileira.
Sob o governo de Jair Bolsonaro, e especialmente durante a passagem de Araújo pelo Itamaraty, houve o rompimento com o multilateralismo histórico do Brasil. O país atacou a ONU, a OMS, relativizou a agenda ambiental, comprou brigas desnecessárias com parceiros estratégicos e priorizou uma relação pessoal e ideológica com Donald Trump, em detrimento das relações institucionais entre Estados. O resultado foi o enfraquecimento do Brasil no cenário internacional e a perda de credibilidade acumulada ao longo de décadas.
A diplomacia, sob o bolsonarismo, deixou de ser política de Estado para se tornar palco de encenação ideológica.
Foi nesse ambiente que Eduardo Bolsonaro decidiu tentar “internacionalizar” o conflito interno brasileiro, articulando sanções contra um ministro do Supremo Tribunal Federal junto ao governo americano. A estratégia era clara: usar Washington como atalho para pressionar instituições brasileiras. O erro foi imaginar que a política externa dos Estados Unidos, pragmática como é, se orientaria por afinidade ideológica ou por militância digital.
Lula entrou em cena pelo caminho oposto. Em vez de ruído, conversa. Em vez de bravata, mesa de negociação. A retirada de Moraes da lista Magnitsky ocorreu no contexto de um diálogo mais amplo com os Estados Unidos, que incluiu temas comerciais e tarifários. Foi uma operação clássica de política externa, conduzida no nível presidencial, com interesses cruzados e ganhos mútuos.
O contraste é didático. Enquanto o bolsonarismo tentou sequestrar a diplomacia para fins domésticos, Lula devolveu a política externa ao seu lugar tradicional: instrumento de defesa do interesse nacional, não de disputas ideológicas. A reversão da Magnitsky não foi um ato de força, mas de método. Não foi espetáculo, mas resultado.
No fim, o episódio resume dois projetos opostos. De um lado, a ilusão de que pressão internacional pode ser fabricada por redes sociais e alianças pessoais. De outro, a prática antiga e eficaz da diplomacia brasileira, que sempre soube que poder se exerce com paciência, credibilidade e negociação. Mesmo tendo passado pelo governo, o bolsonarismo ainda não entendeu por que o Brasil é o primeiro a discursar na Assembleia-Geral da ONU. O erro gigante foi desprezar essa lição básica. Lula apenas a reaplicou.
